1. Introdução
Princípios
são definidos como regras que servem de interpretação das demais normas
jurídicas, apontando os caminhos que devem ser seguidos pelos
aplicadores da lei. Os princípios procuram eliminar lacunas, oferecendo
coerência e harmonia para o ordenamento jurídico.
“São
ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e
conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional, o que
possibilita uma adequada compreensão de sua estrutura. Os princípios
determinam o alcance e o sentido das regras de um dado subsistema do
ordenamento jurídico, balizando a interpretação e a própria produção
normativa.”
Marcelo Alexandrino & Vicente Paulo
Divide-se em princípios explícitos e implícitos, tendo como explícitos: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência, se encontram expressos no caput do Art 37, CF e como implícitos: Supremacia
do Interesse Público, Indisponibilidade do Interesse Público,
Finalidade, Razoabilidade e Proporcionalidade, e Autotutela.
Tendo em vista que o rol do artigo 37 da Constituição Federal é
exemplificativo, os estados podem criar outros quando da elaboração da
sua Constituição (poder constituinte derivado), mas observando aqueles
previstos na Constituição Federal (art. 25 da CF). Os Municípios e o
Distrito Federal também têm essa possibilidade quando da elaboração de
suas leis orgânicas, desde que observados os previstos na Constituição
Federal (art. 29 e 32 da CF). O legislador infraconstitucional também
pode estabelecer outros princípios, desde que não exclua aqueles
previstos no artigo 37 da Constituição Federal.
Os
subordinados aos princípios previstos pelo Art. 37 da CF, são, como
regra geral, a Administração direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, Estados, Distrito Federal, Municípios. Assim, as Autarquias,
Fundações Públicas, Agências reguladoras e executivas, Empresas Públicas
e Sociedades de Economia Mista também estão submetidas a esses
princípios.
2. Princípio da Supremacia do Interesse Público
É
um princípio implícito e embora não se encontre no texto
constitucional, é decorrente das instituições adotadas no Brasil.
Estabelece que toda atuação Estatal deve ser pautada pelo interesse
público, cuja determinação deve ser extraída da constituição e das leis.
Decorre dele a ideia de que, havendo qualquer conflito entre o
interesse público e o particular, prevalece o público, sendo respeitado
os direitos e garantias individuais expressos na CF, e os que dela são
decorrentes.
“O
princípio da supremacia do interesse público, também chamado de
princípio da finalidade pública, está presente tanto no momento da
elaboração da lei como no momento da sua execução em concreto pela
Administração Pública. Ele inspira o legislador e vincula a autoridade
administrativa em toda a sua atuação.”
Maria Sylvia Zanella di Pietro
Assim
como todos os princípios jurídicos, não tem caráter absoluto, não
estando diretamente presente em toda e qualquer atuação da Administração
Pública, mas tem incidência direta sobretudo nos atos em que a
Administração Pública manifesta poder de império (poder extroverso).
“São
atos de império todos os que a Administração impõe coercitivamente ao
administrado, criando unilateralmente para ele obrigações, restringindo
ou condicionando o exercício de direitos ou atividades privadas; são os
atos que originam relações jurídicas entre o particular e o Estado
caracterizadas pela verticalidade, pela desigualdade jurídica. Esses
atos, sim, são fundados diretamente no princípio da supremacia do
interesse público, base de todos os poderes especiais de que dispõe a
Administração Pública para a consecução dos fins que o ordenamento
jurídico lhe impõe.”
Marcelo Alexandrino & Vicente Paulo
Quando
a Administração vem a atuar internamente, o princípio da supremacia do
interesse público não tem incidência direta, pelo motivo de que não há
obrigações ou restrições com necessidade de serem impostas aos
administrados. Outra situação é quando a Administração Pública está na
posição de agente econômico, porque nesses casos, a atuação da
Administração Pública é regida pelo direito privado.
Em suma,
Há incidência direta: Sobretudo, nos atos em que a Administração Pública manifesta poder de império.
Não
há incidência direta: Quando a Administração atua internamente,
mormente em suas atividades-meio, praticando os denominados
atos de gestão e atos de mero expediente. De um modo geral, também
quando a Administração atua como
agente econômico, isto é, intervém no domínio econômico na qualidade de
Estado empresário.
Exemplos de prerrogativas derivadas diretamente do Princípio da Supremacia:
a) As diversas formar de intervenção na propriedade privada;
b) A existência das denominadas cláusulas exorbitantes nos contratos administrativos;
c) As diversas formas de exercício do poder de polícia administrativa;
d) A presunção de legitimidade dos atos administrativos.
3. Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público
É
um dos pilares do regime jurídico-administrativo e dele derivam todas
as restrições impostas à atividade administrativa, restrições essas que
decorrem do fato de a Administração Pública não ser a possuidora da
coisa pública, apenas gestora dos bens e interesses alheios, ou seja, do
povo. Esses interesses e bens são indisponíveis, cabendo a
Administração apenas a gestão de tais a favor da coletividade, titulares
reais dos direitos e interesses públicos.
“Segundo
o princípio da indisponibilidade do interesse público, não se acham os
bens, direitos, interesses e serviços públicos à livre disposição dos
órgãos públicos, a quem apenas cabe curá-los, ou do agente público, mero
gestor da coisa pública. Aqueles e este não são senhores ou seus donos,
cabendo-lhes por isso tão-só o dever de guardá-los e aprimorá-los para a
finalidade a que estão vinculados. O detentor dessa disponibilidade é o
Estado. Por essa razão, há necessidade de lei para alienar bens, para
outorgar concessão de serviço público, para transigir, para renunciar,
para confessar, para revelar a prescrição e para tantas outras
atividades a cargos dos órgãos e agentes da Administração Pública.”
Diógenes Gasparini
Ao
administrador são vedados quaisquer atos que façam por onde a renúncia
aos direitos do Poder Público ou que sem justificativa venha a causar
ônus a sociedade. É um princípio implícito, e dele vem a decorrência de
princípios expressos variados, que norteiam a atividade da
Administração.
A
Lei Geral do Processo Administrativo nº 9.784/99 prevê no seu art. 2º,
parágrafo único, inciso II, a indisponibilidade do interesse público
pela Administração Pública:
“Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
II
- atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou
parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei.”
É de extrema importância ressalvar que o Princípio da Indisponibilidade
do Interesse Público está diretamente presente em toda e qualquer
atuação da Administração Pública, o que se faz diferente ao se falar do
Princípio da Supremacia do Interesse Público, que fundamenta
essencialmente os atos de império em sua forma direta.
“Deveras,
manifesta-se o princípio da indisponibilidade tanto no desempenho das
atividades-fim, quanto no das atividades-meio da Administração, tanto
quando ela atua visando o interesse público primário, como quando visa
ao interesse público secundário, tanto quando atua sob regime de direito
público, como quando atua sob regime predominante de direito privado.”
Marcelo Alexandrino & Vicente Paulo
Tal
princípio faz referência a um ponto trabalhado pela doutrina italiana,
onde se divide os interesses públicos em primários e secundários.
Os
interesses públicos primários são os interesses da massa, do povo, o
interesse geral, enquanto que os secundários são os interesses Estatais,
estando o Estado na qualidade de pessoa jurídica. Tais interesses
secundários são taxados pela doutrina, em regra, como interesses
meramente patrimoniais, onde o Estado procura aumentar sua riqueza,
ampliando receitas ou evitando gastos. Também são considerados
secundários, os atos internos de gestão administrativa, ou seja, as
atividades que existem para fortalecer a Administração como organismo,
mas que só se justifica se tais atividades forem feitas para atuar em
prol dos interesses primários.
“O
interesse público primário, consubstanciado em valores fundamentais
como justiça e segurança, há de desfrutar de supremacia em um sistema
constitucional e democrático. Deverá ele pautar todas as relações
jurídicas e sociais – dos particulares entre si, deles com as pessoas de
direito público e destas entre si. O interesse público primário
desfruta de supremacia porque não é passível de ponderação. Ele é o
parâmetro da ponderação. Em suma: o interesse público primário consiste
na melhor realização possível, à vista da situação concreta a ser
apreciada, da vontade constitucional, dos valores fundamentais que ao
intérprete cabe preservar ou promover.” Luis Roberto Barroso
Em
qualquer hipótese, o interesse público secundário só é legítimo, quando
não é contrário ao interesse primário. Caso essa ocasião venha a
existir, não poderá nem ao menos ser considerado interesse público,
apenas um interesse público ou governamental ilegítimo.
“Caracterizamos
como interesse público secundário legítimo aquele que apresente um
interesse de uma pessoa jurídica administrativa na qualidade de titular
de direitos, mesmo sem implicar a busca direta da satisfação de um
interesse público primário; e possibilite atuação administrativa ao
menos indiretamente tendente à realização de interesses primários.”
Celso Antônio Bandeira de Melo
4. Conclusão
De
fato o interesse público deve ser supremo. Por isso, a Administração
Pública é colocada em um patamar de superioridade em relação aos
particulares, a fim de buscar a realização dos interesses da
coletividade. Para tanto a Administração Pública se vale da supremacia
do interesse público e da indisponibilidade de tal interesse, que tem o
dever de zelar, proteger e administrar tudo que for referente à coisa
pública.
O
interesse individual também deve ser observado pelo administrador e
seguir caminho diverso pode resultar em um grande problema, uma vez que
muitos interesses particulares podem ser suprimidos, ofendendo inclusive
a dignidade humana desse cidadão, preceito este muito bem resguardado
pela Constituição Federal de 1988.
Em
suma, a supremacia do interesse público deve ser utilizada de forma
atenuada pela Administração, pois o interesse privado não pode ser
suprimido ou prejudicado em relação a um interesse publico. Adotando
esse pensamento certamente se tem um Estado Democrático de Direito, em
que interesses públicos e privados são observados e, devidamente
respeitados, pois nenhum deles prevalece sobre o outro, vivendo
harmonicamente entre si.
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